O Diário do meu Pai - Jiro Taniguchi (2024)
By Cathy Scarlet
Livro: O Diário do meu Pai (Chichi no Koyomi)
Autora: Jiro Taniguchi
Ano de Lançamento: 1994
Gênero: Mangá, drama
País: Japão
Editora: Pipoca & Nanquim
Nota: 10
Muito se tem discutido sobre a questão das gerações na nossa atualidade, cada qual evoluindo conforme a sociedade na qual estão inseridas, com suas verdades absolutas e pontos de vista irrefutáveis. Nelas estão arraigadas crenças que cada indivíduo leva ao longo da vida sobre aqueles com quem cresceu e conviveu. Pouco se sabe como essas percepções foram, de fato, se firmando até se transformarem nas imagens que se solidificaram. Imutáveis. Irreparáveis. Turronas. E algo tem sido tópico de reflexão constante para mim: nem todos têm a mesma impressão ou opinião que o outro sobre a mesma pessoa. Pode parecer impressionante e irreal (até surreal, digamos), contudo está no nosso cotidiano, não apenas nas nossas famílias. Historicamente vemos exemplos disso a toda hora. Heróis são endemoniados; vilões são venerados. Por essa razão, quando selecionei esse mangá e me deparei com sua narrativa, não pude deixar de me colocar em ação e compartilhar com vocês mais esse achado valioso: O Diário do meu Pai.
Falemos primeiro do criador dessa obra: Jiro Taniguchi. Este leonino (para aqueles que acreditam em horóscopo) nasceu em Tottori (onde se passa a história da qual falaremos em seguida), no Japão, em14 de agosto de 1947. Com seu estilo próprio, abordou temas adultos de modo sensível e profundo, como observador das sutilezas do mundo. Suas obras foram traduzidas para diversos idiomas e chegaram às nossas mãos, transmitindo uma parcela do legado desse artista que nos deixou em 2017.
Jiro Taniguchi
Em O Diário de meu Pai, temos o retorno do filho pródigo para o funeral de seu progenitor. Yoichi Yamashita passou anos com ressentimento de seu pai após a separação deste e sua mãe, Kiyoko. Numa narrativa delicada e cheia de complexidade, surge diante de nossos olhos a infância de Yoichi ao lado da mãe, do pai Takeshi e de sua irmã mais velha, Haruno. Desde a infância também eram acompanhados pelo tio materno Daisuke, que também era uma figura paterna para o menino.
Em seu velório, o agora homem da cidade começa a se dar conta de nuances da realidade que antes não lhe passavam pela mente. Apesar das dificuldades, viviam como uma família comum e harmoniosa. Porém um terrível incêndio muda os rumos do destino e acaba com o casamento de seus pais, ao impor dificuldades intransponíveis a ambos. Culpando Takeshi pela destruição de seu lar pelo excesso de trabalho e abandono, aos poucos, após muitos anos afastado de casa e sem nunca ter tido uma conversa franca com o pai, vai montando a colcha de retalhos dos eventos sobre o homem de quem fugira e evitara por tantos anos.
Em suma, trata-se de uma história tocante e simbólica das relações humanas que ultrapassou as décadas (lembrando que foi lançada em 1994, mais de 30 anos atrás!) e chega até nós como uma poderosa reflexão que pode ser ampliada para outras esferas e épocas. A questão do ponto de vista e como ele pode nos cegar para os mais ínfimos detalhes que nos levam a compreender o outro e a nós mesmos em contextos distintos é um debate poderoso a ser colocado em pauta nas escolas e nos círculos sociais e familiares.
Somos uma complexidade inerente e ambulante, fadados a nos deixar levar por absolutismos. Julgamos sem nem pensar um instante, assim como propagamos esse pensamento sem considerar as consequências. Quantas pessoas não foram vítimas dessa parcialdiade ? Há famílias inteiras que se apartam porque não souberam resolver impasses tão banais, mas que são dimensionados com o tempo na própria memória dos envolvidos. Fofocas que arrebentam com a reputação de alguém do dia para a noite e, no fim, sem propósito algum. Uma das causas? Esse olhar inviesado e deturpado que temos da realidade com o outro. Não paramos para analisar criticamente nosso próprio julgamento, nossas próprias ações diante do que não compreendemos, do diferente, da escolha de vida de alguém, da personalidade do outro que não precisa coadunar com a nossa para ser respeitada. Queremos apenas moldar o mundo de acordo com nossos ditames. E o que sair disso, nós rejeitamos, ignoramos, destruímos. Espero que a leitura os faça compreender melhor minhas palavras e que estas também não sejam de todo fora da casinha para muitos.
XOXO
REFERÊNCIAS
https://foradoplastico.com.br/jiro-taniguchi-um-mangaka-profundamente-humano/
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